Entre Abelhas e Entre Alteridades

O que acontece quando deixamos de ver o outro - E a nós mesmos?

CULTURA POPFILMES E SÉRIESFILOSOFIA GEEK

Por: Eliel Moura

4/30/20253 min read

Todos os anos, milhares de abelhas desaparecem de colmeias, não se consegue fornecer um número exato, mas o fato é de que misteriosamente as abelhas desaparecerem, algumas podem perder a direção no percurso entre a saída para polinização e retorno para a colmeia, outras podem simplesmente se perder e outras podem desaparecer devido ao uso de pesticida e mudanças climáticas, mas um fato é: abelhas desaparecem.

As abelhas são seres coletivos e essenciais para um equilíbrio ecológico, trabalhando em conjunto e em prol da colmeia, quando as abelhas desaparecem, algo se rompe nesse equilíbrio ecológico, e sua ausência é sentida tanto para a natureza, quanto para os vínculos humanos.

Entre Abelhas é um filme de 2015, dirigido por Ian SBF e conta com Fabio Porchat no papel principal de Bruno, um homem que enfrenta o fim de seu casamento com a mulher que ele ainda ama.

Após o fim do casamento, bruno volta para a casa de sua mãe e tenta retornar sua rotina entre seu trabalho e saída com amigos, mas há uma coisa diferente em bruno, algo invisível, algo que externamente não se nota, algo que nem mesmo bruno consegue identificar, é um vazio interior, uma angústia, uma tristeza constante, um dos primeiros sinais de depressão.

"Acho que o meu medo hoje é acordar e não conseguir me ver no espelho."

Bruno começa notar algo peculiar, as pessoas estão sumindo, antes elas estavam lá, agora não estão mais. Bruno não consegue mais enxergar, nem ouvir as pessoas, sejam os desconhecidos da rua, sejam os famosos da TV, quer sejam seus melhores amigos e até mesmo os familiares.

"O que os olhos não veem, o coração não sente" é um ditado popular que pode servir para entender o que Bruno está passando, Ele começa a se afastar das pessoas, primeiro fisicamente e depois simbolicamente - que é quando elas somem do seu campo de vista. O seu desaparecimento reflete algo muito mais profundo, indicando que ele mesmo se tornou invisível, pois "Sem o outro, o Eu se desfaz" essa é a ideia principal do Eu e o outro, em Sartre, onde o Eu se define em relação ao outro, o olhar do outro é fundamental para a compreensão do sujeito como um Ser objetivo.

É possível ler o filme a partir de uma metáfora sobre a depressão, quando alguém entra em um estado depressivo, pode sentir que o mundo perde a cor, presença e sentido, afinal são as pessoas, os seres e as coisas que dão sentido a nossa existência (?), e quando essas pessoas desaparecem? - e quando o sujeito também desaparece?.

A alteridade é um tema central na filosofia, é o "reconhecimento do outro como outro", ou seja, a capacidade de notar, de perceber, de enxergar e de valorizar aquilo que é diferente de nós mesmos.

Inicialmente, para Bruno, o desaparecimento do outro é um alivio, é menos uma pessoa que pergunta sobre "como ele se sente após o fim do casamento" ou "se a ex-mulher dele já está em um outro relacionamento", mas após o desaparecimento das pessoas que ele ama, como os amigos, a mãe e a ex-esposa, o filme mostra que sem o outro, não há mundo.

Bruno se protege do sofrimento, apagando as pessoas ao seu redor, mas acaba apagando a si mesmo, o estado depressivo de bruno, afasta as pessoas, ele acaba se tornando um quase Gregor Samsa, do clássico "A metamorfose", de Franz Kafka.

Bruno vive o vazio de uma cidade cercada de pessoas, que ele não enxerga e que há a possibilidade de não ser visto, ou pior, forçado a não ser visto, visto que pessoas com diversas dificuldades psicossociais são apagadas e marginalizadas pela sociedade.

Por fim, Bruno Enxerga alguém também marginalizado, alguém também apagado pela sociedade, estabelecendo assim um sinal de reconexão com o outro e até consigo mesmo, simbolizando, talvez o fim de seu luto pelo casamento e o fim de sua depressão chegando.

Porque no final das contas, se somos abelhas soltas sem colmeia e sem vínculos, tudo o que nos resta, é silêncio.

"Até que ponto a gente sabe que existe?"
"Muita gente Passou na minha vida, e eu não lembro mais o rosto. Pra mim, essas pessoas sumiram e essas pessoas também não lembram de mim. Com o tempo, todo mundo vai sumindo pra todo mundo."